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A cover from a 1970s issue of DownBeat.

Commemorating DownBeat's 70th Anniversary:

 - A BÍBLIA DO JAZZ COMPLETA 70 ANOS -

Há 70 anos, em 1º de julho de 1934, foi editado o primeiro número da revista DownBeat, conhecida popularmente como "Bíblia do Jazz" e "Bíblia do Músico". Lida em mais de 160 países, sua transcendental importância é reconhecida por todos os que se interessam pelos acontecimentos no mundo do jazz e da música americana em geral. O primeiro exemplar custava 10 centavos de dólar, era em formato de tablóide e originalmente propunha-se a uma cobertura sobre "salões da dança, cafés, rádio, estúdios e teatros", segundo seu editorial. Sua publicação concretizava um velho sonho de Albert J. Lipschultz, o seu fundador.

Os Estados Unidos saíam de uma grave recessão econômica e o primeiro editorial anunciava que "com o término da crise, o otimismo, há muito ausente, retorna aos semblantes da população. Uma nova era se inicia e a música volta a ser um dos grandes negócios da noite norte-americana. O país possui uma força artístico-musical excepcional. Com 150 mil músicos sindicalizados, nos propomos a atender as aspirações da classe musical, dando total cobertura a todas as atividades dessa área".

O fonógrafo e o disco assumiam importância vital no lazer do povo americano. Surgiam centenas de clubes noturnos, cafés e bares, a maioria com música ao vivo, fontes crescentes de trabalho para milhares de músicos. Todavia, era o rádio que dava maior projeção às orquestras, pequenos conjuntos e seus líderes, transmitindo shows de costa a costa do país. O mais famoso era "Let's Dance", da NBC, que apresentava as orquestras de Xavier Cugat, Ken Murray e Benny Goodman, este iniciando sua caminhada para a fama, realizando pouco depois uma completa revolução na música americana.

A DownBeat chegava em boa hora. Com escritório central em Chicago, posteriormente instalou filiais em New York e Los Angeles, os maiores centros do país. Mobilizando uma equipe de críticos, repórteres e fotógrafos, cobria virtualmente todos os acontecimentos importantes no universo da vida musical americana. A partir de então, sua trajetória marcante estabeleceu normas e padrões para a imprensa especializada.

A despeito de o seu primeiro número alcançar grande sucesso, a DownBeat não foi a pioneira em sua especialidade. Essa primazia coube a outra revista, a Metronome, fundada em 1883, que firmara seu conceito, embora sua cobertura se restringisse aos espetáculos de music hall e vaudeville, além de matérias sem conteúdo crítico sobre ragtime, blues e danças populares, incluindo o charleston e o shimmy, entre outras.

A concorrência foi benéfica. A DownBeat adotou outra linha, obrigando a Metronome a atualizar-se, reforçando seu quadro de colaboradores. Com isso, ganharam os leitores, havendo maior agilidade de informação e qualidade de crítica. Com o desaparecimento da Metronome, em dezembro de 1961, a DownBeat ficou absoluta no mercado, embora outras revistas tenham surgido, mas sem ameaçar sua incontestável liderança até os anos 80.

Uma das inovações da DownBeat amplamente imitada foi a de dar cotação às críticas de discos utilizando estrelas, variando de zero a cinco, em vez de números. Outra inovação, a partir de 1936, foi a realização anual de concursos para eleger os melhores músicos e as melhores orquestras através de votação dos leitores. A Metronome não perdeu tempo; a partir de 1939 realizou idêntica votação e, para sobrepujar a concorrente, no ano seguinte passou a produzir e gravar um disco com os vencedores, intitulado Metronome All Stars, que repetiu anualmente até 1953, voltando a fazê-lo pela última vez em 1956.

Outra inovação que resultou muito valiosa para os leitores da DownBeat foi a edição anual de livros reunindo todas as críticas publicadas entre 1956 e 1963, hoje raríssimas peças de colecionadores que valem uma fortuna.

A partir de 1953, a DownBeat promoveu um jazz poll exclusivamente com críticos, tendo como novidade a eleição da categoria "novos talentos". A Metronome lançou seu primeiro anuário em 1951, e a DownBeat seguiu o mesmo caminho em 1956.

Uma curiosidade pouco divulgada foi que a DownBeat criticou discos de música clássica nos anos 50 e 60.

Ao longo dos anos, seus editores - todos conhecidos e respeitados por seus vastos conhecimentos musicais - Hal Webman, Jack Tracy, Don Cerulli, Don Gold, Gene Lees, Don DeMicheal, Dan Morgenstern, Jack Maher, Charles Doherty, Michael Bourne, o atual Jason Koransky e tantos outros dignificaram sua linha de atuação, expandindo os horizontes da revista.

Em 1951, a DownBeat contratou a peso de ouro o famoso crítico Leonard Feather, então colaborador da Metronome, onde desde 1946 publicava o célebre Blindfold Test (prática criada por ele e bastante difundida entre os aficionados do jazz, consistindo em submeter várias gravações ao julgamento de um convidado sem qualquer conhecimento prévio do que ouvia). A idéia original de Feather era de permitir ao convidado uma função crítica totalmente isenta, sem idéias ou opiniões preconcebidas. O primeiro teste publicado na DownBeat foi em 23 de março de 1951, e continua sendo uma das colunas de maior interesse, embora, com a saída de Feather, passou a ser conduzido por Howard Mandel, Fred Bouchard, Lee Jeske e Bert Primach e inúmeros outros.  Com relação ao Blindfold Test, ocorreu uma curiosa novidade no anuário de 1958: vários músicos selecionaram gravações para submeter Leonard Feather ao teste, em inédita reversão do processo, do qual o crítico saiu-se relativamente bem.

Entre as centenas de críticos que passaram por suas páginas, colaboraram jornalistas da maior expressão no jazz, entre os quais Leonard Feather, Ira Gitler, Dan Morgenstern, Don DeMicheal, Don Gold, Don Cerulli, Harold Jovien, Jack Tracy, John A. Tynan, Martin Williams, Nat Hentoff, Nat Shapiro, Barbara J. Gardner, Frank Kofsky, John Wiliam Hardy, John S. Wilson, Lee Jeske, Bert Primach, Bill Milowski, Fred Bouchard, Howard Mandel, Herry Frost, o trompetista Kenny Dorham e tantos mais.

A DownBeat cresceu continuamente, aumentando o número de leitores, assim como o dos seus críticos e correspondentes. Alguns dos seus correspondentes no Brasil foram Sylvio Túlio Cardoso, Marilyn Ballamaci e Christopher Pickard.

Inevitavelmente, com o passar dos anos ocorreram inúmeras mudanças. O formato tablóide foi substituído pelo de revista nos anos 50. Sua publicação quinzenal passou a ser mensal em 1979.  Em 1967 houve uma drástica guinada na sua orientação, passando a cobrir também o rock, motivando forte reação dos leitores, que enviaram centenas de cartas protestando contra a mudança.

A partir dos anos 60, atendendo a reivindicações dos músicos, principalmente dos novatos e estudantes, passou a editar colunas instrutivas sob orientação de músicos e professores conceituados. Outra função da sua proposta educacional foram as transcrições completas de solos e arranjos gravados por músicos importantes.

Cumprindo uma das suas finalidades educacionais mais relevantes, a partir da década de 70 a DownBeat concede anualmente dezenas de bolsas de estudos para o famoso Berklee College of Jazz, de Boston.

Durante muitos anos a direção da revista promoveu o DownBeat Jazz Festival em Chicago.

A DownBeat continua sendo a revista mais popular entre os jazzófilos de todo o mundo, ainda que parte deles prefira outras publicações congêneres. Ao completar 70 anos de atividade, mantém sua tradição em cobrir o panorama da música americana. Seu número comemorativo dos 70 anos alcançou enorme repercussão nos Estados Unidos, Europa, Japão e outros países do mundo.

--José Domingos Raffaelli



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